Copacabana Blues

Leoni Siqueira
1 min readFeb 14, 2019

O turista americano mergulha seus olhos no verde-azul ondulante que se espraia para lá da arrebentação e transborda por trás da costura do horizonte, ponto de encontro com outro azul: o celeste leitoso da tarde tropical. Para ele, aqui é feito de festa. E de luz.

A quatro quarteirões dali, minha mãe enfrenta as luzes ásperas e truculentas do CTI Azul. Depois de passar a noite em claro, tremendo de frio numa poltrona metálica, coberta de plástico azul naval, é minha irmã quem assume agora a dúvida, ao lado dela no Leito 16. O que é ser um bom filho?

Livre dos barulhos dos monitores, da invasão febril de enfermeiras, enferrujo minha culpa na maresia da orla, enquanto sou ofuscado pelas flores eufóricas da camisa do turista, que, um tanto afoito, exibe seu iPhone X aos olhos famintos dos pivetes. Suas fotos capturam o paraíso azul dos flyers das agências de turismo.

Daqui a trinta minutos tenho que voltar para o hospital. Não roubaria seu celular, mas seus olhos azuis. Para eles, aqui é feito de festa. E de luz.

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